terça-feira, 6 de maio de 2008

Como andas pela terra

Nunca li nenhuma tragédia grega, a não ser curtos trechos em aulas, que meu ex-professor passava nos meus tempos de colegial.
Mas foi menos por falta de interesse do que por falta de oportunidade. Em verdade, interesse eu até tenho, e quanto à oportunidade, englobem-se todas as desculpas cotidianas: falta de tempo (para procurar), falta de lembrar (de ir atrás), falta de dinheiro (para comprar um livro) e até falta de prioridade (sim, porque há uma lista de desejos com mil itens em prioridade).
Por enquanto, só para matar essa vontade de falar um pouquinho sobre o tema, fica este post mais como uma curiosidade, que espero que também desperte em você, querido (a) leitor (a), um pouco de interesse sobre tragédias gregas ou mesmo a mitologia grega. Entretanto, que - diferente de mim - nunca dê tais desculpas esfarrapadas e vá logo atrás de um bom livro.
A única tragédia que me ocorre no momento é de Édipo - rei. Sim, é o mesmo Édipo que dá o nome ao famoso complexo de Édipo de Freud. Mas isso é outro assunto, sobre o qual eu tenho menos conhecimento ainda.
Essa peça pode ser vista sobre muitas perspectivas, de modo que põe em expressão variadas temáticas, sendo por isso considerada uma das tragédias mais perfeitas da Grécia Antiga.
Vou encurtar a história.
O rei de Tebas, Laios, recebe uma maldição: seu próprio filho o matará, e este, dormirá com sua própria mãe, esposa de Laios.
Édipo então é entregue à morte, mas acaba sendo salvo e parando nas mãos do rei de Corinto.
Édipo descobre, já adulto, sobre sua maldição e, numa tentativa de fuga, sai de Corinto para evitar tal tragédia, dirigindo-se para Tebas. Édipo, porém não sabia que o rei de Corinto não era seu verdadeiro pai. No meio do caminho, encontra um bando de mercadores e seu amo, matando-os todos.
Chegando a Tebas, Édipo decifra o enigma da esfinge, livrando a cidade de um terrível monstro. Como recompensa, recebe a mão de Jocasta, viúva do rei de Tebas, e todo o reino.
Tebas vem a ser vítima da ira dos deuses, pois o assassino de Laios continuava na cidade. Quando Édipo descobre que o amo que matara era seu próprio pai e Jocasta sua mãe, arranca seus próprios olhos e foge da cidade, exilando-se, e Jocasta suicida-se.
Para quem quiser ler o resumo, um pouco mais detalhado, recomendo este link.


Abrindo meu parêntesis.

Lembro-me muito bem de meu professor explicando tal peça dando ênfase na figura do Destino. Que era impossível dele fugir. Pois não importa com quantas linhas se escreva uma história, o fim será sempre o mesmo.
Mas até hoje, o que me chamou mais atenção foi o que li em Convite à Filosofia. É que, infelizmente, como disse, nunca tive acesso à obra na íntegra. Mas há outros personagens, só para citar, Labdácio (avô de Édipo), por exemplo.
Quando disse que a peça abrangia várias temáticas estava só introduzindo o que gostaria de dizer agora.

"Édipo", do grego, significa "pé inchado", "Laios", "pé torto" e "Labdácio", "coxo". Repararam numa coisa? Todos os nomes dos personagens referem-se a um defeito no pé ou perna. É que naquela época, com todos aqueles deuses que habitavam suas crenças, os gregos procuravam de alguma forma exprimir sua condição de mortalidade. E Sófocles o relaciona com a terra. Veja. Se nascidos da terra, eram imortais; mas se nascidos de um homem e de uma mulher, meros mortais. Por isso a dificuldade de caminhar sobre a terra. Mais acertadamente, em se relacionar com a terra (com o imortal), o que metaforiza a dificuldade em aceitar sua mortalidade. Além disso, pela própria tragédia em si, infere-se a fragilidade das leis humanas¹, em que Laios manda Édipo ser morto, Édipo acaba por matá-lo, porém, e por desposar sua própria mãe.
Sinceramente, estou para conhecer alguma peça que consiga manter tamanho entrosamento entre o plano literal e o plano metafórico.

E não sei quanto a você, mas eu nunca tive nenhuma dificuldade em aceitar essa condição de mortal, nem a mínima vontade de ser imortal. Aliás, nessas condições, como seria o nome da personagem? Fiquei curiosa... do grego: telos/teleios = perfeito e podos/podes = pé

Ah! sei lá, que viajada!Mas posso dizer, nessa metáfora, que ando muito bem pela terra, obrigada. E você?

___


¹CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia.

2 comentários:

Carla Menezes disse...

Adorei esse post, parabéns pelo excelente texto!
Reuniu 2 coisas que adoro ler, apesar de não ter profundo conhecimento: filosofia e mitologia grega (fantástico!).
Eu ando meio coxa (poxa!) pela terra, mas muito bem por me permitir ser demasiadamente humana...

=***

Anônimo disse...

Eu procurava por comentários sobre um escritor e fui parar em um blog que também tinha um link para o seu.
Um bom abraço!