domingo, 3 de agosto de 2008

Quero voltar a ser eu

O post de hoje contém um pequeno trecho de O pescoço da girafa, por Max Nunes.
Tomei conhecimento deste texto no ano passado, durante uma aula de interpretação de textos do cursinho, cujo ingresso meu deu-se por uma bolsa adquirida, caso contrário não o teria em hipótese alguma frequentado.
O fato é que, sempre passando os olhos cuidadosamente pelos textos a que sou exposta (diariamente) algo sempre chama a atenção. Esse foi mais uma obra dessa fisgada discreta que tanto me faz gostar do mundo da escrita.
O nome do post é homônimo ao texto de Nunes. Boa Leitura!

Eu, que era eu – sim, porque eu já fui eu -, cheguei à triste conclusão de que não sou mais eu. Meu nome, que, por isso mesmo, já esqueci, não interessa a mais ninguém. Para um médico, por exemplo, sou apenas o cliente. Num restaurante, sou freguês. Quando alugo uma casa, viro inquilino. Na condução, passageiro. Nos correios, sou remetente. Num supermercado, consumidor. Para o imposto, sou contribuinte; com o prazo vencido, viro inadimplente. Para votar, sou eleitor; mas, num comício, sou massa.
Viajar? Viro turista. Na rua, caminhando, sou pedestre; se me atropelam, sou acidentado; no hospital, paciente; para os jornais, sou vítima. Se compro um livro, viro leitor; para o rádio sou ouvinte; para o Ibope, espectador; e, para o futebol, eu, que já fui torcedor, virei galera.
Já sei que, quando eu morrer, ninguém vai se lembrar do meu nome. Vão me chamar de “o finado”, “o extinto”, “o falecido”, e, em certos círculos, até de “o desencarnado”. Só espero que o padre, na missa de sétimo dia, não me chame de “o sucumbido”. Logo a mim, que, no meu apogeu, já fui mais eu.

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