sexta-feira, 15 de abril de 2011

O anúncio

Procuro alguém para conversar.
 Não estou à procura de um amor nem de um melhor amigo.
Procuro apenas alguém para conversar.
Procuro alguém que entenda
como pode ser tão humano apenas conversar,
 alguém para quem tudo bem de vez em quando eu dizer o óbvio
só para quebrar o silêncio indesejável,
alguém para quem “bom dia”
não seja mais um sinal da trivialidade na qual nos colocamos dia após dia,
 alguém que saiba que uma conversa
no melhor estilo elevador e “faz sol, faz chuva”
pode ser tão confortante quanto às vezes é preciso estar só.

Procuro alguém para conversar.
 Não quero que se zanguem pela imbecilidade que existe
em dizer que prato comi hoje ou ontem.
Não quero que deixem de me dizer tudo que pensam
apenas porque posso parecer frágil em alguns momentos.
Quero que conversem comigo.
 Não é pela carência.
É mais por um efeito recíproco daquela poesia drummondiana:
 quero escutar voz de gente, deixar de ser pobre!
Mas também gosto de me contar, me dispar e gritar
(mesmo que só por dentro).
Só quero alguém para conversar.

Procuro alguém para conversar.
 Alguém que possa dizer as mesmas coisas
sempre de novas maneiras
sem parecer mentira ou exagero,
 mas que se mentir ou exagerar,
eu me divirta tanto quanto o sujeito que narra,
e que ninguém se machuque por causa disso.
 Alguém a quem eu possa contar a mesma história
 infinitas vezes e rir sempre com a mesma intensidade.
 Ou chorar, por que não?
Não por causa das lembranças em comum.
Mas por causa da revelação,
 de tudo aquilo que aquela conversa representa.

Procuro alguém para conversar.
Não me dêem terapeutas, psicólogos ou pessoas do gênero.
 Não, não há nada de errado com esses profissionais.
Mas também não há nada de errado comigo,
obrigado.
 Eu quero alguém para conversar
sem  ter de encostar minha cabeça num divã
aberto a teorias infindáveis de quem sou pelo que fiz.
Eu quero alguém que possa conversar comigo
sem o olhar de um doutorzinho na vida,
pois que doutores da vida
todos somos desde quando nascemos.

Procuro alguém para conversar
até quando todos os assuntos possíveis tiverem se esgotado,
 e o verbo for algo escasso.
Procuro alguém que saiba que conversar
vai além da sonoridade das palavras:
 uma boa conversa sempre é regada de gestos
 (talvez até bem teatrais),
 risadas, olhares, caretas e até de silêncio.

Por fim, procuro alguém para conversar.
Alguém a quem eu possa dizer “adeus”
sem parecer “adeus” ao pé da letra.
Alguém que entenda que adeus é só uma palavra oca
 que inventaram para partir corações.
 Que seja um “adeus” de brincadeira então,
 só para dar um pouco de saudade e logo dizer “voltei!”
 e daí se conversarem novamente.

Adeus!

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